Sobre a Linha de Arganil

A história do Ramal da Lousã começou com o anúncio oficial da sua construção em 1873, por portaria no reinado de D. Luís I. No entanto, só em 1887 foi outorgada a concessão de uma linha de via reduzida, de Coimbra a Arganil, com passagem em Miranda do Corvo e Lousã, à firma "Fonsecas, Santos e Viana".
Pouco tempo depois a firma solicitou a substituição da via reduzida por uma via larga, com a ideia de prolongar o ramal até à Covilhã. No mesmo ano um novo alvará outorgou a concessão à Companhia do Caminho de Ferro do Mondego da linha Coimbra-Arganil, numa extensão de 62 km.
Em 22 de Fevereiro de 1889 é assinada uma escritura entre a Companhia do Caminho de Ferro do Mondego e Eugène Beraud para a construção da Linha de Coimbra a Arganil. Neste mesmo ano começaram as obras do Ramal.
Estavam os trabalhos já muito adiantados quando rebentou a crise de 1890, com tal influência nos negócios da Companhia que obrigou à paralisação completa dos trabalhos. Tendo sido declarada a falência da Companhia em 1897, só em 1903 o problema foi ultrapassado com o recurso a um empréstimo obrigacionista por parte da empresa.
Em Janeiro de 1905, e depois de 15 anos de interregno, recomeçaram as obras do ramal.
Como relatava à época o semanário “A Comarca de Arganil”, o primeiro comboio a vapor chegou à vila da Lousã às 13:37 de 16 de Dezembro do 1906. “Houve grandes festejos – muita música e muitos foguetes, tendo afluído ali enorme quantidade de pessoas”, relatou o semanário de então. Ainda o jornal “Louzanense” escreveu “Está em festa a Lousã. A partir de hoje, tem lugar no mundo activo e febril da civilização; ficam-lhe abertas as portas de todos os grandes centros da actividade humana (…) A partir de hoje tem a Lousã o seu caminho-de-ferro”.
A circulação no novo ramal começou com quatro viagens diárias, duas entre Coimbra e Lousã e outras duas no sentido inverso, demorando o trajecto cerca de hora e meia. No entanto, e devido à onda de protestos, em 1907 anunciou-se o alargamento dos horários da linha. E foi também nesta altura que o troço se estendeu à Figueira da Foz.
A extensão do caminho-de-ferro a este concelho do interior do distrito de Coimbra, passando por Ceira e Miranda do Corvo, esteve associada à poderosa indústria papeleira local (fábricas do Penedo, na Lousã, e do Boque, em Serpins), cujos responsáveis, especialmente Francisco Silveira Viana, apostaram durante décadas na concretização do projecto, nos planos político e financeiro.
No espaço de tempo compreendido entre 1907 e 1927 foram feitas várias tentativas para levar o caminho de ferro da Lousã, até Góis e Arganil, empreendimento que nunca foi finalizado, devido à mudança da monarquia para a república, ao deflagrar da I Grande Guerra Mundial, às graves crises económico-sociais que agitaram o início do Século XX e ao “crash” da bolsa de 1929, que teve graves repercussões na economia mundial.
Em 1923 a Companhia do Caminho de Ferro do Mondego conseguiu um empréstimo de 10.000 contos junto da Caixa Geral de Depósitos. Foi feito um contrato de construção com a Companhia Portuguesa, mas esta empresa alterou o traçado da linha, encarecendo-o e gastou em apenas 6 km o dinheiro que estava orçado para chegar da Lousã a Arganil.
Em 10 de Agosto de 1930, 24 anos mais tarde portanto, é inaugurado o troço Lousã-Serpins e, apesar dos protestos dos habitantes de Arganil, até hoje a ligação não foi concluída.
O transporte de mercadorias, designadamente materiais de construção e madeiras da serra da Lousã (em grande parte destinadas à indústria de celuloses para papel) foi abandonado pela CP nos anos 90.
Mais recentemente, discute-se da reconversão do Ramal isto é, de maneira a que este possa suportar o Metro Ligeiro de Superfície de Coimbra. Chegou a ser pensada uma extensão a Góis e Arganil, mas tal não é pelo menos para já equacionado.
O actual serviço de transporte ferroviário no Ramal da Lousã movimenta um milhão de passageiros por ano, segundo nota emitida pela CP aquando da celebração do centenário deste.

A cronologia acima descrita, poder-nos-ia levar a escrever sobre tudo e mais alguma coisa. Apenas vou aqui dar a minha opinião, que vou tentar que seja sucinta.
Passaram 118 anos desde a contratualização da construção da Linha de Arganil. 118 anos e o papel do Caminho de Ferro em termos fundamentais não se alterou: o de permitir não só um mais rápido transporte de pessoas e mercadorias, como também ligar o Interior do nosso país ao mais desenvolvido Litoral. O que não está em causa não é o contrato como é evidente. O que está em causa é o que por aí adiante se passou. Fala-se na cronologia dos porquês de o empreendimento não ter sido finalizado. Pode-se dizer que em parte foi também um misto de azar e aselhice. Azar devido aos condicionalismos de então: Primeira Guerra Mundial, a falência do Reino em 1890 e o “crash” bolsista de 1929 em nada ajudaram a vontade de prolongar o Ramal; aselhice derivada de tudo o resto. Porém desde 1929 passaram-se quase oito décadas e como é evidente, não permanecemos em crise durante oito décadas. Durante o Estado Novo são conhecidas as preocupações economicistas do Dr. Salazar, prolongadas de certa maneira por Marcello Caetano. Durante este período admito que pouco ou nada se podia fazer a não ser que apetecesse ao poder de então. Contudo, já passam mais de 30 anos desde a nossa última Constituição, que institucionalizou a Democracia. Não que o tenha efectivado porque hoje são muito poucos os lugares que não são corrompidos e burocratizados por esta mesma democracia. Ainda assim, já tivemos mais do que oportunidades para avançar com isto! E porque é que não avançou? Será que são assim tão poucas as centenas de pessoas que se deslocam diariamente de Arganil ou Góis para a sede de distrito? Ou porque é que eu, apesar da minha tenra idade, nunca ouvi um discurso político convicto, coerente e crítico em busca de uma obra que ia favorecer não só as gentes do concelho, como também daquelas que têm Arganil destino, seja a nível laboral ou de lazer? Será que o concelho de Arganil tem assim tanta gente que mereça estar tão longe de um grande centro? Será que vale mais abandonar a ideia, baixar os braços e deixar o concelho envelhecer de tal maneira a que um dia todo o concelho seja visto na Internet como uma gigantesca aldeia fantasma?
Pois bem, resumindo o que foi dito no parágrafo anterior, creio que é notória a minha opinião sobre o assunto. Creio que a avançar para este projecto, tem que ser agora! Não pode haver mais adiamentos ou condicionalismos da mais variada ordem. E as gentes do concelho têm que ser mobilizadas pela causa, sob pena do concelho se atolar ainda mais, sozinho, isolado, perdido. Apenas mais um neste nosso Portugal.

3 de Maio de 2007

* João Carlos da Silva Jorge Antunes, 19 anos, a frequentar a licenciatura de Economia na Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa